Quinta, 22 de março de 2018

Receita médica universal

Nem tudo, enfim, está perdido. Ainda podemos sonhar. É o que você confere nesta edição, que também homenageia os buritis eternizados por Guimarães Rosa

Hiram Firmino - redacao@revistaecologico.com.br



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O choro seco, enfim, da natureza roseana que continuamos destruindo, adoentados de nós mesmos. Tal como uma parcela crescente de médicos que hoje, sem a humildade do doutor Rosa e munidos de tablets, celulares de última geração e muita ciência, não costumam mais olhar nos olhos da gente. Só escrevem, pedem exames e morremos juntos, tamanha a desumanidade.

O choro seco, enfim, da natureza roseana que continuamos destruindo, adoentados de nós mesmos. Tal como uma parcela crescente de médicos que hoje, sem a humildade do doutor Rosa e munidos de tablets, celulares de última geração e muita ciência, não costumam mais olhar nos olhos da gente. Só escrevem, pedem exames e morremos juntos, tamanha a desumanidade.

Numa época tão rasa de valores humanos, razão de viver e saúde planetária, a Revista Ecológico inicia nesta edição a nova série cultural “O Viés Médico na Literatura de Guimarães Rosa”. Reproduzida do livro homônimo do escritor e ambientalista Eugênio Goulart, professor de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro do Projeto Manuelzão, a pesquisa passa a receita humana do escritor de “Grande Sertão: Veredas” aos próprios médicos no exercício de suas vidas profissionais.

Como pontuou outro colega de Goulart, o também médico e professor João Gabriel Fonseca, que assina o prefácio, esses profissionais de saúde deveriam fazer uma espécie de “exame periódico de consciência. O que talvez contribuísse para melhorar a qualidade da relação médico-paciente, tão em baixa nestes tempos pós-modernos”. E Fonseca conclui: “Fará muito bem aos médicos lerem esta série”.

Fará um bem até na sua alma, caro leitor, ler o que um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos, auscultou, anotou e prescreveu como um simples “médico da roça”. Um profissional incomum da medicina do passado que, a cavalo, percorrendo os rincões de Minas, conheceu o valor místico do sofrimento humano, a partir do que é ser mineiro. E o que todos nós sempre sofremos vendo as veredas do nosso grande sertão em transe, virando deserto.

O choro seco, enfim, da natureza roseana que continuamos destruindo, adoentados de nós mesmos. Tal como uma parcela crescente de médicos que hoje, sem a humildade do doutor Rosa e munidos de tablets, celulares de última geração e muita ciência, não costumam mais olhar nos olhos da gente. Só escrevem, pedem exames e morremos juntos, tamanha a desumanidade.

Por falar em morrer de vida não vivida ou de tristeza (“Apertou em mim aquela tristeza, da pior de todas, que é a sem razão de motivo”), você vai saber também, caro leitor, nas “Páginas Verdes” desta edição, outra constatação de natureza médica. Não de um médico colega de profissão de Guimarães Rosa, mas de um agricultor e pesquisador que o Brasil ainda não conhece como deveria. Trata-se do pesquisador e agricultor suíço Ernst Götsch, para quem não há mais cura em nós, nem no planeta, que já nos expulsa sabiamente, recolhendo suas nascentes d’água. Ambos – homem e natureza – somos vítimas de nós mesmos, o tal Homo sapiens, vulgo o câncer já em metástase galopante em toda a face da Terra. 

Só receita e diagnóstico ruim nesta edição? Não. A esperança, cuja cor verde não é à toa, lembremos também, é a última que morre. O gênio Walt Disney (você também vai ver o seu receituário aqui) já sabia disso décadas atrás. Para educar ambientalmente as milhares de pessoas que visitam os parques da Disney em Orlando, na Flórida (EUA), a não jogarem lixo no chão da sua cidade de fantasia real, o que ele fez? Mandou instalar uma lixeira a cada 20 passos que o visitante der. Resultado: ninguém tem coragem de sujar o cenário de diversão e alegria que ele criou. Tal como Mickey, personagem principal de seu mundo mágico, hoje igualmente ecológico.

Nem tudo, enfim, está perdido. Ainda podemos sonhar. É o que você confere nesta edição, que também homenageia os buritis eternizados por Guimarães Rosa.

Boa leitura!

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