Segunda, 07 de agosto de 2017

Ambientalista: profissão mortal

Brasil lidera, pelo quinto ano consecutivo, o ranking de países que mais matam os defensores do meio ambiente

redacao@souecologico.com.br



font_add font_delete printer
Dorothy Stang: executada a tiros no Pará, em 2005, ela denunciava fazendeiros e madeireiros que destruíam a Floresta Amazônica. Foto: Divulgação

Dorothy Stang: executada a tiros no Pará, em 2005, ela denunciava fazendeiros e madeireiros que destruíam a Floresta Amazônica. Foto: Divulgação

Por cinco anos consecutivos, o Brasil é o país mais violento para se lutar pelo meio ambiente e pelo clima do planeta. Segundo o relatório da organização Global Witness divulgado em julho último, o ano de 2016 bateu recorde de assassinatos de lideranças e ativistas defensores dos direitos ligados à terra e à proteção da natureza. Novamente no topo da lista, o Brasil contabilizou 49 das 200 mortes mapeadas no ano passado. Segundo um dos responsáveis pelo estudo, esse número é provavelmente ainda maior, mas nem sempre os casos chegam ao conhecimento público, ou suas reais causas são relatadas. 

O avanço da fronteira agrícola, além da construção de grandes empreendimentos de infraestrutura, como barragens e hidrelétricas, são os vetores por trás desse cenário. A maioria dos assassinatos ocorreu na região amazônica, principalmente em Rondônia, Pará e Maranhão, onde madeireiros e grandes proprietários de terras são os principais suspeitos. Segundo a organização, a falta de proteção aos ativistas, juntamente com o enfraquecimento das legislações ambientais e dos direitos indígenas, ajudou a alimentar a violência.

Apesar de serem os mais afetados, esses estados não têm um programa de proteção que garanta a segurança das vítimas. O Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos da Secretaria da Presidência da República atende a sete estados do país, mas não àqueles que mais precisam. De acordo com a organização, a corrupção também desempenha um papel crucial, uma vez que garante a aprovação rápida e muitas vezes sem critério de projetos madeireiros e do agronegócio. “Os ativistas são forçados a se manifestar e, em muitos casos trágicos, são silenciados por seus atos”, sentenciou um dos organizadores do relatório.

A tendência é que essa violência aumente, já que o agronegócio quer expandir suas atividades abrindo mais 15 milhões de hectares até 2026, segundo dados do próprio setor. “A Global Witness acredita que a situação de terras e, consequentemente, dos defensores ambientais no Brasil irá se agravar drasticamente caso os planos do governo para reverter os direitos indígenas e de proteção ambiental sigam em frente. Temer já diluiu leis e instituições ligadas aos direitos humanos e ao meio ambiente. Se ele continuar a ceder ao lobby agrícola os assassinatos de defensores provavelmente aumentará”, afirmou a organização.

Para o cacique Roberto Marques, liderança do povo indígena Anacé, do Ceará, que também figura na lista de ameaçados de morte no Brasil, essa é uma questão muito séria, para além da vida individual de cada uma das vítimas. “Na minha luta diária a gente é ameaçado toda hora. Recentemente eu denunciei uma destruição dentro do nosso território. Temos que fazer isso. É a única forma de proteger o homem dele mesmo. O risco se agrava quando abraçamos uma causa justa pelo coletivo, mas que vai de encontro a interesses de quem domina o capital.”

Segundo ele, cujo território não é demarcado até hoje, a falta de agilidade da Funai (Fundação Nacional do Índio) e dos órgãos competentes se soma a outros fatores, como o poder das grandes construtoras, empresas petrolíferas e a permissividade das autoridades. “Nós lutamos na base. E não abrimos mão da nossa tradição, do nosso conhecimento, da nossa terra. Se o governo quer dessa forma matar a terra, então vai nos matar também. Pode já estar tudo perdido, mas nós vamos perder lutando”, frisou Roberto Anacé.

A Global Witness atesta que, embora tenham sido encontrados poucos casos de mortes ligadas diretamente ao petróleo e gás na Amazônia brasileira, é preocupante que essas concessões estejam sendo dadas sem o consentimento prévio e informado das comunidades locais. “Isto é o cerne da causa para os ataques contra os defensores. As pessoas se sentem obrigadas a combater projetos quando não têm poder de voz sobre o que acontece às suas terras e os recursos naturais nelas presentes. Conceder novas licenças para exploração de petróleo e gás sem a participação das comunidades locais nas decisões é a receita perfeita para atrair mais violência”, afirmou o porta-voz da organização.

A instituição responsabiliza governos, empresas e investidores pelo pano de fundo que leva às mortes. “Eles precisam atacar as causas do aumento da violência, não autorizar ou participar dos projetos. Além disso, os assassinos precisam ser responsabilizados.” 

 

Saiba mais: globalwitness.org

Compartilhe

Comentários

Nenhum comentario cadastrado

Escreva um novo comentário
Outras matérias desta edição